George Orwell, o intelectual mais disputado entre direita e esquerda

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George Orwell é o pseudônimo de Eric Arthur Blair. Nasceu na índia Britânica e se tornou um dos maiores escritores de seu tempo, destacando-se pelo seu olhar clínico da realidade e suas geniais distopias literárias.

É sabido que começou como um socialista convicto e desiludiu-se após quase ser morto pelos expurgos de Stálin na guerra civil espanhola, quando lutava pelo POUM, a facção anarquista que os stalinistas faziam questão de sabotar até chegarem às vias de fato e executarem as suas lideranças. Orwell escapou por pouco.

Passou pela mesma desilusão outro proeminente autor, o americano de ascendência portuguesa John dos Passos, que foi para a Espanha ao lado de Hemingway. Hemingway permaneceu socialista, por ter uma personalidade orgulhosa demais para se permitir alguma mea-culpa. Dos Passos terminou sua carreira como um conservador.

Orwell, segundo o historiador Paul Johnson, também teria evoluído para um conservadorismo de facto se tivesse vivido um pouco mais (morreu em 1950, aos 46 anos). Desde o seu livro sobre a guerra espanhola, ele passou a ser detestado pelos marxistas britânicos, e seria ainda mais após as publicações de Revolução dos Bichos e 1984, boicotada por editores esquerdistas como Victor Gollancz, escritores e autoridades comunistas no governo.

Entretanto, Orwell também era detestado pelos tóris por seus posicionamentos ardentemente anti-imperialistas e por debochar do nacionalismo. Acreditava no estado de bem estar social, votava nos Trabalhistas e trabalhou por um longo tempo em revistas de esquerda, como a Partisan Review.

Resumidamente, este era Orwell: anti-imperialista, anti-comunista, anti-fascista, social-democrata na economia, anti-feminista, contra o aborto e, digamos, reticente com os homossexuais. Ele também era firme na sua posição quanto aos papéis do homem e da mulher, prezando que um permanecesse com as suas características masculinas e o outro com a sua feminilidade.

Se necessário colocá-lo em um campo político, ele seria um típico social-democrata anticomunista da década de 1930, com opiniões conservadoras no âmbito social. É o tipo de esquerdista mais à direita que se pode encontrar, e que quase não mais existe no século XXI dominado pelo politicamente correto (uma das exceções é Christopher Hitchens, falecido intelectual britânico e autor de uma das melhores biografias do Orwell).

Talvez, se Orwell tivesse vivido mais 25 anos para ter conhecimento da amplitude dos crimes de Stálin após o Vigésimo Congresso de 1956 ministrado por Kruschev, para acompanhar o Grande Salto Adiante de Mao Zedong em 1958 e sua Revolução Cultural na década seguinte, para saber das revoltas dentro do Pacto de Varsóvia, para ver os crimes do Khmer Vermelho no início da década de 1970 e, na mesma época, ter acesso aos escritos de Soljenitsin, é difícil acreditar que não se tornaria um direitista completo.

Afinal, o que mais o afastava dos direitistas ingleses da época, a discussão sobre o imperialismo britânico (antes de se tornar escritor, Orwell trabalhou como policial na Birmânia inglesa como um ferrenho anti-imperialista), é algo que a maioria dos conservadores modernos concordam com Orwell.

O notável filósofo inglês e conservador Theodore Dalrymple trabalhou como médico em países africanos sob domínio britânico e afirma categoricamente que o imperialismo só trouxe o caos por tentar implementar, de forma pouco cuidadosa, uma cultura totalmente estranha a local.

Surgiram sentimentos políticos tóxicos que até hoje dominam a política do Terceiro Mundo pós-imperialista. E o que havia de positivo (i.e. as instituições criadas pelos britânicos, que eles acreditavam que permaneceriam como o maior legado) simplesmente não perduraram, sendo rapidamente corrompidas.

Pode-se afirmar que grande parte dos tóris (como são chamados os eleitores do Partido Conservador inglês) percebia que o imperialismo britânico foi um grande fracasso, mas encontrava-se sob um dilema patriota de querer manter o império nacional pelo maior tempo possível, por questão de honra.

Na Guerra Fria, com o fim das discussões sobre imperialismo britânico e fascismo europeu, e com o mundo gravitando em torno do medo do comunismo, Orwell seria atraído para a direita por questão de princípios antitotalitários e pela sua ojeriza à ideologia. Com efeito, alguns intelectuais britânicos socialistas observaram, na ocasião do óbito de Orwell, não sem algum alívio, que se vivesse por mais alguns anos “provavelmente se tornaria um tóri“.


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